A Secção de Xadrez do Sporting foi formada oficialmente em 1958, por iniciativa de um Professor da Faculdade de Letras de Lisboa, de origem romena, Victor Buescu. Buescu era um amador muito activo e dedicado - conservamos na Secção vários dos seus cadernos de apontamentos e registos, extremamente organizados - mas um jogador mediano. Representava antes a 2ª categoria do Ateneu Comercial de Lisboa, que acolhera o Grupo de Xadrez de Lisboa quando este deixou as instalações da Sociedade de Geografia.
Criar a Secção não foi uma tarefa fácil. Escreveu ao presidente do Sporting da altura, Francisco Cazal-Ribeiro, propondo a formação de uma Secção de Xadrez no clube, mas aquele, figura grada do regime e certamente pouco ou nada interessado em xadrez, nem sequer respondeu.
Acontece que Cazal-Ribeiro era administrador da recentemente criada CIDLA, empresa do grupo SACOR, e Buescu conhecia pessoalmente o Presidente da Administração da petrolífera-mãe, a quem se queixou de não ter obtido resposta da sua carta ao Sporting. Reza a lenda que Cazal-Ribeiro foi chamado à presença do seu superior e interrogado sobre a sua falta de cortesia. O certo é que, pouco tempo depois, foi anunciada a nova Secção de Xadrez do Sporting, dotada com um generoso orçamento para material.
Se esta história, que ouvi com pormenores cinematográficos (tais como o tal Administrador a fitar Cazal-Ribeiro por cima dos óculos) a um antigo jogador e Capitão de Secção já falecido, José Salgado, aconteceu ou não exactamente assim, nunca conseguiremos saber. Pelo menos os pormenores devem ser adição sua, que não devia lá estar ninguém para os testemunhar.
Logo no ano de abertura a Secção conseguiu reunir uma equipa bastante forte, que contava com jogadores como Daniel Oliveira, António Rocha, Araújo Pereira ou José Vinagre. Na que julgamos ter sido a primeira prova colectiva em que participou, perdeu o Campeonato de Lisboa para o Benfica apesar do empate global nos encontros entre ambos. Por este quadro, o Sporting teria ganho num sistema de pontos de encontro e não soma de pontos de partida, mas na verdade o torneio foi a duas voltas, com dois encontros entre as equipas, e não é possível reconstruir os resultados, que seriam relevantes, dos dois primeiros contra os restantes.
O Sporting conquistou logo a seguir o Campeonato da Associação de Xadrez do Sul, vencendo o Benfica no embate entre ambos. Na fotografia do encontro também se vêem, além dos jogadores do Sporting, outras figuras conhecidas, como Júlio Santos (4º tabuleiro dos encarnados) e Vasco Santos (de pé, na cabeceira da mesa).
Nas épocas de 58, 59 e 60 não se disputou o Campeonato Nacional de Equipas. Em 1961, sabemos que venceu o Benfica, seguido do campeão anterior (1956) - o Grupo de Xadrez Alekhine - e do GX Guimarães. Só conhecemos os primeiros três classificados e não encontramos documentos que permitam saber se o Sporting não se classificou para o Nacional ou se ficou abaixo do terceiro posto.
Victor Buescu não se conformou com este mau resultado. Em reunião da Secção de Outubro de 1961, propôs aos restantes seccionistas - Araújo Pereira, José Vinagre, António Rocha, Manuel Giestas e Fernando Melício, que se tentasse trazer Joaquim Durão para a equipa, sugerindo que este poderia dar aulas a troco de uma verba "para transportes". A ideia mereceu a aprovação de todos os seccionistas, não sem algumas reservas e condições. Um deles, Manuel Giestas, sugeriu que fosse igualmente feito um convite a João Mário Ribeiro (que havia representado o Benfica mas que estava afastado nessa altura por razões profissionais) para integrar a equipa, ao que Buescu respondeu já ter encetado contactos nesse sentido e ter recebido resposta positiva do jogador.
Assim, o Sporting apresenta-se ao início da época de 1962 fortemente reforçado por aqueles que seriam, provavelmente, os dois mais fortes jogadores portugueses. Conquistou o direito de acesso ao Nacional e, quando este se realizou, nas instalações do Ateneu Comercial de Lisboa, conseguiu um triunfo "arrasador" com 10 pontos em 12 possíveis (mais uma vez, a classificação determinava-se pela soma dos pontos de partida e não pelos pontos de encontro, como hoje sucede).
Na última sessão o Sporting bateu o Grupo de Xadrez Alekhine por 4-0, com vitórias de João Mário Ribeiro, António Rocha, Joaquim Durão e José Vinagre. No outro encontro, o GX Guimarães derrotou o Benfica por 3-1, garantindo o 2º lugar, com 5½. Seguiram-se GX Alekhine com 5 e o Benfica, anterior campeão, com 3½.
O Campeonato de 62 iniciou o primeiro dos três "tri-campeonatos" conseguidos pelo Sporting, igualmente vencedor em 63 e 64.
Não sabemos bem quando, mas antes de 1964, Buescu abandonou a Capitania da Secção, alegadamente por motivos profissionais, e passou o testemunho a António Rocha. Também este se demitiria no início de 1964 - a julgar por alguns documentos conservados no arquivo da secção, esta terá atravessado uma crise organizacional por estes anos. Em 1965 o Sporting não aparece nos três primeiros do Nacional (onde teria acesso na condição de Campeão anterior), não sabemos se jogando ou se não se apresentando.
Um novo título nacional só viria em 1967, mas disso falaremos noutra ocasião.
Victor Buescu |
Criar a Secção não foi uma tarefa fácil. Escreveu ao presidente do Sporting da altura, Francisco Cazal-Ribeiro, propondo a formação de uma Secção de Xadrez no clube, mas aquele, figura grada do regime e certamente pouco ou nada interessado em xadrez, nem sequer respondeu.
Acontece que Cazal-Ribeiro era administrador da recentemente criada CIDLA, empresa do grupo SACOR, e Buescu conhecia pessoalmente o Presidente da Administração da petrolífera-mãe, a quem se queixou de não ter obtido resposta da sua carta ao Sporting. Reza a lenda que Cazal-Ribeiro foi chamado à presença do seu superior e interrogado sobre a sua falta de cortesia. O certo é que, pouco tempo depois, foi anunciada a nova Secção de Xadrez do Sporting, dotada com um generoso orçamento para material.
Se esta história, que ouvi com pormenores cinematográficos (tais como o tal Administrador a fitar Cazal-Ribeiro por cima dos óculos) a um antigo jogador e Capitão de Secção já falecido, José Salgado, aconteceu ou não exactamente assim, nunca conseguiremos saber. Pelo menos os pormenores devem ser adição sua, que não devia lá estar ninguém para os testemunhar.
Logo no ano de abertura a Secção conseguiu reunir uma equipa bastante forte, que contava com jogadores como Daniel Oliveira, António Rocha, Araújo Pereira ou José Vinagre. Na que julgamos ter sido a primeira prova colectiva em que participou, perdeu o Campeonato de Lisboa para o Benfica apesar do empate global nos encontros entre ambos. Por este quadro, o Sporting teria ganho num sistema de pontos de encontro e não soma de pontos de partida, mas na verdade o torneio foi a duas voltas, com dois encontros entre as equipas, e não é possível reconstruir os resultados, que seriam relevantes, dos dois primeiros contra os restantes.
Notícia sobre o Campeonato de Lisboa na revista "Ajedrez Español" |
O Sporting conquistou logo a seguir o Campeonato da Associação de Xadrez do Sul, vencendo o Benfica no embate entre ambos. Na fotografia do encontro também se vêem, além dos jogadores do Sporting, outras figuras conhecidas, como Júlio Santos (4º tabuleiro dos encarnados) e Vasco Santos (de pé, na cabeceira da mesa).
Encontro com o Benfica no Campeonato da AX Sul: 3-1 para os leões. |
Nas épocas de 58, 59 e 60 não se disputou o Campeonato Nacional de Equipas. Em 1961, sabemos que venceu o Benfica, seguido do campeão anterior (1956) - o Grupo de Xadrez Alekhine - e do GX Guimarães. Só conhecemos os primeiros três classificados e não encontramos documentos que permitam saber se o Sporting não se classificou para o Nacional ou se ficou abaixo do terceiro posto.
Victor Buescu não se conformou com este mau resultado. Em reunião da Secção de Outubro de 1961, propôs aos restantes seccionistas - Araújo Pereira, José Vinagre, António Rocha, Manuel Giestas e Fernando Melício, que se tentasse trazer Joaquim Durão para a equipa, sugerindo que este poderia dar aulas a troco de uma verba "para transportes". A ideia mereceu a aprovação de todos os seccionistas, não sem algumas reservas e condições. Um deles, Manuel Giestas, sugeriu que fosse igualmente feito um convite a João Mário Ribeiro (que havia representado o Benfica mas que estava afastado nessa altura por razões profissionais) para integrar a equipa, ao que Buescu respondeu já ter encetado contactos nesse sentido e ter recebido resposta positiva do jogador.
Abertura da acta da reunião de Secção em que se tomou a decisão de convidar Joaquim Durão e João Mário Ribeiro a juntarem-se ao Sporting. |
Assim, o Sporting apresenta-se ao início da época de 1962 fortemente reforçado por aqueles que seriam, provavelmente, os dois mais fortes jogadores portugueses. Conquistou o direito de acesso ao Nacional e, quando este se realizou, nas instalações do Ateneu Comercial de Lisboa, conseguiu um triunfo "arrasador" com 10 pontos em 12 possíveis (mais uma vez, a classificação determinava-se pela soma dos pontos de partida e não pelos pontos de encontro, como hoje sucede).
Na última sessão o Sporting bateu o Grupo de Xadrez Alekhine por 4-0, com vitórias de João Mário Ribeiro, António Rocha, Joaquim Durão e José Vinagre. No outro encontro, o GX Guimarães derrotou o Benfica por 3-1, garantindo o 2º lugar, com 5½. Seguiram-se GX Alekhine com 5 e o Benfica, anterior campeão, com 3½.
O Campeonato de 62 iniciou o primeiro dos três "tri-campeonatos" conseguidos pelo Sporting, igualmente vencedor em 63 e 64.
Não sabemos bem quando, mas antes de 1964, Buescu abandonou a Capitania da Secção, alegadamente por motivos profissionais, e passou o testemunho a António Rocha. Também este se demitiria no início de 1964 - a julgar por alguns documentos conservados no arquivo da secção, esta terá atravessado uma crise organizacional por estes anos. Em 1965 o Sporting não aparece nos três primeiros do Nacional (onde teria acesso na condição de Campeão anterior), não sabemos se jogando ou se não se apresentando.
Um novo título nacional só viria em 1967, mas disso falaremos noutra ocasião.
Comentários
Talvez ainda existam mais pormenores.
Eu recordo um jogador do fim da década de 50 de nome Botelheiro (Eng.º)
Tentarei acrescentar pormenores se os conseguir consolidar pois a minha longa mas fraca carreira na modalidade está ligada ao SCP, às sessões de simultâneas aos sábados à noite e ao Mestre António Rocha, um dos simultaneadores, nas instalações , salvo erro, da R. do Salitre.
Fernando Alves
Efectivamente, esse nome (Engº Botelheiro) era muitas vezes referido nas histórias, quase sempre divertidas, que os mais antigos contavam na secção, quando para lá entrei em 1979.
A antiga sala de xadrez do Sporting (antes de se mudar para a barbearia atrás do antigo Estádio) era na sede da Rua do Passadiço, que não cheguei a conhecer.