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Na passagem do primeiro ano desde a morte de António Moura


Fez no passado dia 4 de Novembro um ano desde que nos deixou o António Moura, finalmente vencido em longa partida contra um adversário demasiado forte. Uma perda imensa para os seus amigos e para a Secção de Xadrez do Sporting, que ficou órfã do seu entusiasmo e da sua dedicação sem iguais.





Conheci o António Moura no Campeonato Nacional de Rápidas de 1976, em Abrantes, onde fomos sumariamente apresentados por um amigo comum. Era, então, uma “figura” da sua sempre querida Académica de Coimbra, que dividia com o Sporting a sua paixão clubística. Pouco tempo depois, em Agosto do mesmo ano, foi um dos mais divertidos e populares participantes do Campeonato Nacional de Juniores, quando praticamente todos os jogadores partilhávamos um dormitório improvisado no ginásio da escola secundária de Peniche. Neste torneio jogámos pela primeira vez um com o outro, na última sessão.

Embora nos conhecêssemos, portanto, pode dizer-se que a nossa amizade começou a firmar-se (já ele tinha mudado para Lisboa e trocado, no xadrez, a Académica de Coimbra pela da Amadora) quando ambos fizemos parte da Direcção da FPX presidida pelo Horácio Neto, na década de 80. Pode até dizer-se que foi nesse tempo que se iniciou o hábito de nos juntarmos semanalmente para jantar,  grupo que começou por ser dos directores da Federação, antes da reunião semanal e que se mantém desde então, quase ininterruptamente, há mais de 30 anos, entre amigos e elementos do xadrez leonino. O Moura raras vezes faltava!

António Moura, ao fundo, com Rui Silva Pereira, Nuno Amaral e Valdemar Lopes, numa equipa do Sporting do início da década de 1990.
Apesar de fervoroso sportinguista, apenas se juntou ao xadrez do clube já no início da década de 90 (ou talvez no fim da de 80, não estou certo). Assumiu depois importância crescente na nossa actividade, sobretudo quando, após a saída de Ramiro Lopes, recebeu as responsabilidades deste na Secção, e foi, neste século, o elemento mais preponderante da nossa organização. Já bastante doente, ainda deu o seu último contributo como jogador à equipa principal no concentrado do Nacional da II Divisão - por coincidência em Coimbra, onde nasceu e onde viria a falecer poucos meses depois.


Também data do início da década de 80 a sua ligação ao xadrez por correspondência – na altura, ainda disputado por correio tradicional –, que viria a aprofundar-se até ao fim da vida com a participação em provas e selecções nacionais e que foi coroada, em 2012, com o título de Campeão Nacionalpor Correspondência, conquistado no XII Campeonato Nacional da especialidade. Era também SIM, Senior International Master, o segundo título mais elevado da hierarquia da ICCF, que é o organismo que tutela a modalidade a nível mundial. Detinha já duas das três normas necessárias à subida ao escalão mais importante, o de Grande Mestre da ICCF.

Esteve igualmente envolvido na criação e nos primeiros passos da organização dedicada à modalidade em Portugal – então denominada Comissão Nacional de Xadrez por Correspondência, que funcionava na dependência da Federação Portuguesa de Xadrez e que deu lugar, em 2010, à Associação Portuguesa de Xadrez por Correspondência, de cuja Direcção fez parte até ao seu falecimento. Representou-nos por várias vezes nos Congressos da ICCF, o que o tornou conhecido e popular na comunidade internacional do xadrez à distância.

Em Junho passado, assinalando o dia do seu aniversário, a APXC iniciou dois torneios internacionais dedicados à sua memória, o mais forte dos quais atinge a categoria 10 (média ELO 2495) e nos quais participam alguns dos seus melhores amigos e companheiros da equipa do Sporting que disputou a fase final da Champions League da modalidade ou em selecções nacionais.



Uma homenagem justa dos seus companheiros do xadrez à distância, ao qual tanto deu.

Numa das suas primeiras participações na selecção de xadrez postal (nesse tempo, mesmo postal), na partida contra o MI argentino Carlos Rinaldi terminada em 1983, entrou na discussão teórica de uma linha muito aguda da Defesa Alekhine com uma inovação que, na altura, melhorava para as brancas relativamente a uma partida Gruenfeld-Ljubojevic de 1979. O argentino não encontrou a melhor defesa e a partida, com comentários do próprio Moura, teve honras de inclusão no que era talvez a mais importante e prestigiada publicação de xadrez da época, o Sahovski informator jugoslavo. A defesa correcta para a novidade só viria a ser encontrada no ano seguinte, também num jogo do israelita Gruenfeld.


Segue a partida, com comentários do vencedor, complementados com os meus (precedidos por [RP]), estes com a ajuda do Stockfish.



Comentários

Unknown disse…
Que saudade da energia e entusiasmo do António Moura...quando o conheci foi no princípio da década de 80, na excelente escola que era a secção da A. A. Amadora, com uma actividade que se reflectia muito bem no Moura.
Magnífica partida contra o Rinaldi! Eram mesmo outros tempos...
O Moura merece este artigo e esta homenagem!
Paulo Fernandes, com respeito e saudade...
Unknown disse…
Que saudade da energia e entusiasmo do António Moura...quando o conheci foi no princípio da década de 80, na excelente escola que era a secção da A. A. Amadora, com uma actividade que se reflectia muito bem no Moura.
Magnífica partida contra o Rinaldi! Eram mesmo outros tempos...
O Moura merece este artigo e esta homenagem!
Paulo Fernandes, com respeito e saudade...

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